quarta-feira, 18 de março de 2009

Max Payne – Vingança sem emoção no noir-falso de John Moore

Max Payne (Max Payne, Canadá/EUA, 2008)

De: John Moore

Com: Mark Wahlberg, Mila Kunis, Olga Kurylenko

 

 

 

 

 

 

Um homem sem nada a perder e muito a lamentar, a procura da mais cruel das vinganças e sem absolutamente nenhum receio de encontrar a morte em seu caminho. Drogas, um submundo do crime riquíssimo e sujo até a mais profunda raiz. Uma cidade infestada de criminosos e o pior tipo de gente, cheia de sombras para se esconder e lugares sombrios em que coisas inacreditáveis acontecem. Corrupção, alucinações, emoções extremas e um final apoteótico, violento e regado de sangue. Ingredientes corretíssimos para realizar a magia do que se convencionou chamar de film-noir. Criado na época da Segunda Guerra Mundial por certos cineastas alemães que aos poucos chegavam a terra do cinema, o estilo sombrio de filmar e as tramas hediondas que poderiam ir do sobrenatural ao realista conquistaram o público americano sedento por grandes histórias para se desviar do horror que o mundo vivia. Influenciado pelo expressionismo germânico e seu representante maior, Fritz Lang (“M – O Vampiro de Dusseldorf”), o film-noir reinou absoluto como o entretenimento adulto mais garantido da época, se aliando espertamente ao gênero policial para criar grandes clássicos do cinema como “O Falcão Maltês” e “Floresta Petrificada”. Em comum, eles tinham os elementos secundários das tramas, alguns arquétipos de personagem e principalmente o estilo de filmagem baseado no contraste do preto e branco da época. Quase duas décadas depois de um reinado absoluto, o noir caiu em desuso conforme as tecnologias do cinema iam se aprofundando e a limitação a histórias mais violentas ia se tornar mais frouxas. Não era mais preciso se prender a um gênero para contar uma trama com os elementos descritos acima, e o público estava, é claro, cansado da analógica falta de cores nas obras dos diretores. Foram precisos trinta anos da ponderação hollywoodiana e de testes discretos com alguns diretores autorais para que se nascesse o que hoje chamamos de neo-noir, carregado pelas habilidosas mãos de Robert Rodriguez (“Sin City”) e Christopher Nolan (“Insônia”) e sustentado por primazia técnica combinada com o deslumbramento visual em favor da trama que o estilo sempre pregou. Sim, estilo é importante, pelo menos se você realmente quiser fazer a platéia embarcar na jornada que seu filme se propõe. Mesmo para o realismo de alguns dramas, a estética precisa ser bem definida, calculada, ponderada. Estilo, seja ele noir ou qualquer outro nome que você possa querer dar, não é exagero, e sim sutileza. É necessária uma impressionante parcimônia ao lidar com contrastes para que o resultado final não acabe tomando a proporção inversa do que se pretendia. Quando isso acontece, o resultado é um filme visualmente desagradável e excessivo, que bloqueia do espectador a concentração na trama e acaba por prejudicar seriamente as sensações que a obra pretende passar para seu espectador. Em resumo, o que acontece é “Max Payne”.

Não sou um daqueles críticos nerds que costumam massacrar qualquer filme baseado em um jogo de vídeo-game. Pelo contrário, até compreendo que o cinema almeje provocar a mesma experiência de imersão que alguns jogos alcançam, e qualquer um que tenha jogado ou ouvido falar de “Max Payne”, o vídeo-game, sabia que aquela história era feita para ser contada no cinema. Primeiro, porque resgatava toda a estética do noir clássico de sessenta anos atrás. Depois, porque possuía uma trama visceral e repleta de pequenos detalhes que muitas vezes passavam despercebidos por quem tivesse uma visão unilateral dos fatos. O formato cinematográfico poderia facilmente resolver essa questão e ainda trazer de volta com toda a força um dos momentos mais marcantes de sua história. Poderia, se não tivesse caído nas mãos de John Moore (“Atrás das Linhas Inimigas”) realizar tal feito. O irlandês, conhecido pela excelência ao dirigir momentos de adrenalina, não deu conta de todo o recado e acabou escorregando feio ao criar uma estética que pretende ser noir mas passa dos limites e encontra uma espécie de hibridismo estranho e sem sentido que desvia a atenção do espectador. Embora não escorregue nunca nos momentos de ação e tampouco cometa algum grave erro em relação aos ângulos de sua câmera, o mundo criado por ele para seu personagem soa tão artificial e repulsivo que acaba contaminando os diálogos pronunciados pelos atores e dissolvendo o impacto emocional que o roteiro poderia causar. Face a face com tamanho descaminho visual, é quase desumano julgar o trabalho do estreante Beau Thorne ao adaptar o vídeo-game de Sam Lake. A sua versão para o atormentado policial até conegue superar as dificuldades e ressoar forte em algumas passagens mais intensas, mas não encontra repercussão mais significativa graças ao trabalho terrrivelmente equivocado do diretor. Seus diálogos passam perto demais do clichê em alguns momentos e a solução do conflito não é a melhor que se poderia esperar com sua surpresa estapafúrdia, mas ainda assim não resultaria em uma peça de cinema tão desprezível se não fosse o massacre de digitalização presente em cada minuto e o clima tão mal-trabalhado dos ambientes. Sem preconceitos contra a indústria de Hollywood, mas esse é indiscutivelmente o calcanhar de Aquiles dos cenários criados artificialmente: sem a demonstração real, nenhum diretor é capaz de prever como uma tomada pode parecer ou soar antes da pós-produção, quando será tarde demais para corrigir os erros. Um defeito que Rodriguez superou com méritos em sua adaptação de quadrinhos, mas que Moore se vê incapaz de lidar depois de dois pares de filmes de ação e suspense que surpreenderam na bilheteria mas não agradaram a crítica em geral.

De qualquer forma, a trama não soa das mais criativas, embora tenha funcionado as mil maravilhas nos games: Max Payne (Mark Wahlberg) é um amargurado policial que teve sua família assassinada há mais de três anos e continua obcecado em encontrar o assassino. Quando a ambígua femme fatale Natasha Sax (Olga Kurylenko) é encontrada morta logo após um jogo de sedução com o policial, frustrado graças a sua fidelidade a finada esposa, novas pistas acabam surgindo e um inferno astral é desencadeado para o protagonista, que passa por perseguição policial, desconfiança extrema e alucinações demoníacas. A mistura de tudo isso com tráfico de drogas e traição inesperada deu certo para quem mergulhava na experiência do jogo para computador, mas acaba saindo pela culatra quando o jogador não é capaz de controlar o personagem. E a situação piora, é claro, quando atores pouco inspirados tomam a linha de frente. Para ser sincero, Wahlberg (“Atirador”) faz o que pode, mas se vê preso nas limitações do personagem construído pelo roteiro, sutilmente distinto daquele que povoava a obra original e ainda assiste a interpretação esforçada ser jogada de escanteio no final, que pretende impressionar com seu primeiro raio de sol em 100 minutos de projeção e erra ao dar um tom impessoal ao acontecimento. A ucraniana Olga Kurylenko, mais conhecida como a bondgirl de “Quantum of Solace”, tem pouco tempo de tela mesmo para impressionar pela beleza, que dirá pelo talento interpretativo que demonstrou no filme do espião inglês. Também ucraniana, Mila Kunis (“That’s 70s Show”) se junta ao restante do elenco com pouco a fazer como meros coadjuvantes da jornada do protagonista, que deveria ser emocionante com sua metáfora final e a realização do profundo desejo de vingança de um personagem atormentado. Mas não é. Por mais que se esforce (ou não), “Max Payne” passa pelo espectador tão frio quanto a neve digital que cai eternamente pela cidade de pixels construída pelos melhores efeitos de Hollywood.

Nota: 3,0

3 comentários:

Diego Rodrigues disse...

Com certeza, é um dos piores filmes de 2008, talvez até o pior.

Só discordo quanto a Walhber. Ele não faz o que pode. Ele é um ator muito limitado, se pegarmos toda a sua filmografia em apenas duas produções ele atuou bem: Boogie Nights e Os Infiltrados. É um ator muito fraquíssimo. Mas o projeto tinha tudo para dar errado. A começar pela fotografia, pela seriedade que longa é feito. Mas acabou a tortura e eu não preciso mais assistir. Ainda bem!

jana disse...

Gostei da sua sinopse,
volterei sempre pra conferir seu comentário sobre filme lançados
O layout tbm tá bacana, combina com o tema.
quando puder visite meu blog
www.saideiraeaconta.blogspot.com.br

Anônimo disse...

Desculpe mas discordo totalmente!
Não é um suspense, muito menos um film-noir. As cenas de ação são muito boas, e o surpriendente e frenético final é um dos melhores ja vistos no cinema. Vale a pena sim assistir!