Pode ter passado voando, mas é um fato a ser encarado. O tempo é assim, inexorável e inevitável, algo poderoso que não para e não se deixa afetar pelas vontades e controles de nós, meros humanos. Mas o tempo passa, e o homem produz coisas extraordinárias. A cada dia cresce a consciência de nossa espécie em relação ao meio que nos cerca e, acima de tudo, não paramos. Não paramos com os negócios, não paramos nem mesmo com o doloroso e cruel sistema de capital que criamos para nós mesmos. Não paramos com a arte. Que dirá com o cinema, hoje a forma de expressão mais vendável, popular, fascinante e abrangente que se vê por aí. Os filmes estão lá, prontos para serem vistos, julgados e atirados a própria sorte. Afinal, cinema é acima de tudo uma equação que precisa de elementos precisos, acertados, equilibrados. Especialmente em tempos como esses em que nos vemos refletindo sobre tudo o que se passou há tanto tempo e as conseqüências desses atos para a sociedade dos dias de hoje, o elemento mais forte e decisivo de um filme é a honestidade. O passo a seguir é quase óbvio. Afinal, se um filme precisa soar como a vida real, são os humanos em frente as câmeras que precisam convencer de forma mais contundente. Atores, atrizes. Não por coincidência, em uma década na qual a participação feminina no cinema recebeu uma injeção de credibilidade com novas cineastas surgindo por aí, elas terminaram ganhando contronos de maior destaque, sempre tomando o holofote principal como a categoria mais disputada dos prêmios espalhados pelo mundo. Estamos às portas do fim da primeira década do século 21. Nada mais justo do que se lembrar das estrelas que brilharam mais fortes nesses nove anos.
10ª posição: Maria Bello em Encurralados (2007)
Se toda unanimidade é burra, então não há porque evitar de falar de alguém que possue seus admiradores e seus críticos. No caso da atriz Maria Bello, aliás, os últimos existem aos borbotões por aí depois da britânica assumir o manto de Rachel Weisz no terceiro e malfadado capítulo da série A Múmia. Críticas de fãs e sua validade deixadas de lado, o fato é que assistir a Bello em um momento de inspiração é como observar uma força da natureza tomar conta da tela. Excelente em todos os gêneros e estilos que se propõe a fazer, a atriz brilhou mais do que nunca ao lado de um Pierce Brosnan também inspirado no suspense Encurralados. A trama de seqüestro envolvendo os dois mais o marido da personagem de Bello, interpretado por Gerard Butler, é uma das menos notadas e mais criativas dos últimos anos, com um desfecho de cair o queixo e as palavras finais mais arrepiantes desde muito tempo. E advinhe quem as profere? Bello, é claro, atingindo um nível de suspense, calafrios e crueldade quase impossível de suportar, virando ao contrário a cabeça do espectador e nos presenteando com a melhor demonstação de um dos maiores talentos dos últimos e, esperamos dos próximos anos. Em sua boca, em sua atuação, cada palavra e ato de Abby Randall adquire um novo significado e toda a maestria de sua atuação vem a tona em uma única cena, aproveitada em cada segundo e expressão pela excelência de Bello. Talento puro e brutal, com toda a pompa inglesa, apenas a espera de uma mulher de mentira pela qual valha a pena trabalhar.
Futuro? Adepta dos filmes independentes, Bello tem pelo menos meia dúzia de filmes recentes que ainda não aportaram no Brasil. Certeza mesmo até agora parece só Downloading Nancy, um polêmico thriller virtual, e o drama The Private Lives of Pippa Lee, estrelado por Keanu Reeves na pele de um homem comum que entra numa espiral de puro desespero. Em filmagens ela está com The Company Men, primeiro “filme de crise” produzido por Hollywood, e Grown Ups, próximo filme de Adam Sandler.
9ª posição: Toni Collette em Pequena Miss Sunshine (2007)
Equilibrar comédia e drama pode ser tarefa difícil para um roteirista que se proponha a redigir um filme com os dois elementos, mas é fato consumado que fica para os atores desse tipo de obra a missão mais hercúlea de todas. Para a mistura agridoce funcionar, a receita é, pura e simplesmente, seres humanos de verdade povoando a tela. E, por mais estranho que possa parecer, é muito mais difícil para um ator interpretar esse tipo de personagem do que um cheio de trejeitos e aspectos marcantes capazes de gravar na memória do espectador. Não se trata de uma repetição, mesmo porque pessoas de verdade nunca são as mesmas de um minuto para o outro, mas acima de tudo é preciso carisma. Felizmente, isso e talento são duas coisas que Toni Collette tem de sobra. Não que ela seja uma atriz de impressionar a cada cena, mas sua forma peculiar de construir personagens com nuances e momentos pequenos que fazem toda a diferença de alguma maneira casa bem com a comédia dramática. Tanto que sua atuação em Pequena Miss Sunshine é a chave para entender e se envolver na família disfuncional que protagoniza o filme. Na pele da “normal” Sheryl Hoover, a atriz australiana encontra o ponto de equilíbrio ideal entre desespero e conformação, mesclando cenas de puro desabafo com outras propositadamente contidas para construir um personagem capaz de mexer com as emoções do espectador sem deixar de ser a sólida rocha do primeiro minuto de filme. Um dessmpenho invejável e detalhista que merece mais destaque do que teve.
Futuro? Está comprometida com o papel principal da série de TV United States of Tara, criada pela badalada Diablo Cody (Juno), cujos doze primeiros episódios atraíram audiência suficiente para evitar o cancelamento.
8ª posição: Maggie Gyllenhaal em Mais Estranho Que a Ficção (2006)
Hollywood pode ser um lugar cruel com quem tenta a sorte em suas ruas. A escada para a fama é longa, de degraus íngremes e ainda tem os mais inimagináveis obstáculos pela frente. Maggie Gyllenhaal teve seu nome para ajudá-la e ainda assim só conseguiu seu discreto lugar na capital do cinema apoiada no irmão Jake, como coadjuvante do cult Donnie Darko. Daí para frente, ela seguiu com equilíbrio invejável, fazendo as escolhas certas e, de quando em quando, sendo permitida a mostrar todo o talento que tem. E se Mais Estranho Que a Ficção se tornou a obra-prima subestimada que é, então boa parte do mérito deveria ir para Maggie. Sua Ana Pascal é o ponto de equilíbrio de um roteiro criativo do início ao fim, a calmaria de normalidade em meio a chuva de idéias bizarras do genial Zach Helm. No papel da padeira sonegadora de impostos pela qual o protagonista, um fiscal da Receita que começa a ouvir a narração da própria vida, se apaixona, Maggie é um poço de serenidade com vida e brilho próprios. Perfeccionista, detalhista mas acima de tudo instintiva em cena, ela constrói aos poucos a ligação emocional mais forte de todo o filme, chegando ao final como o elemento conciliador de um clímax conflitante dominado pela competência caricata de Will Ferrell. É notável o quanto Maggie se destaca entre os coadjuvantes de peso do nível de Emma Thompson e Dustin Hoffman, protagonizando a própria história e tornando cada cena algo um pouco mais especial. Nunca uma história de amor foi tão encantadora. E nunca Maggie demonstrou o quanto mais de espaço seu talento merece para brilhar.
Futuro? A participação em O Cavaleiro das Trevas deu um empurrão a mais em sua carreira, e ela está no ainda inédito Away We Go, filme de verão inusitado do diretor Sam Mendes (Beleza Americana), dessa vez sem a presença da esposa, a atriz Kate Winslet (O Leitor). Está escalada também para co-estrelar a continuação da comédia infantil Nanny McPhee ao lado da protagonista e criadora da trama Emma Thompson, com quem contracenou em Mais Estranho Que a Ficção.
7ª posição: Helena Bonham-Carter em Sweeney Todd (2007)
Não é missão para qualquer atriz a de se destacar contracenando com o sempre excepcional Johnny Depp. Especialmente quando este se apresenta com uma caracterização estourada e impressionante de um personagem atormentado e cheio de nuances. A bem da verdade, Sweeney Todd, primeiro musical assumido de Tim Burton e quinta parceria de diretor e astro, é o show dele. O que apenas torna ainda mais importante a presença de Helena Bonham-Carter, que adiciona uma boa dose de obsessão amorosa e, mais tarde, de sentimento fraternal, ao interpretar a Mrs. Lovett que conspira com o protagonista para sua vingança e ainda arranja um jeito de faturar com seu negócio de tortas. Helena faz seu trabalho de forma impressionante, achando o ponto certo para a personagem não soar estranha no contexto bizarro mas surpreendentemente denso criado por Burton e pelos roteiristas. Não é uma missão fácil, mas ela a desempenha com instinto e força invejáveis, conseguindo não soar apagada quando contracena com Depp e criando uma química com ele que só pode ser descrita como maravilhosa de se assistir. Em certa cena, quando os dois olham pelas janelas da loja dela para planejarem o maligno e sangrento plano de vingança, a dança entre os dois, as vozes que se confundem, a letra que pinga ironia de cada palavra e as duas atuaçõs se integram em uma conjunção virtualmente perfeita que é capaz de trazer junto até o maior dos críticos dos musicais. A verdade é que Helena é mesmo uma atriz capaz de desempenhar qualquer papel e ainda sair-se com uma desenvoltura no mínimo surpreendente. E a Mrs. Lovett de Sweeney Todd é o brilho maior desse talento.
Futuro? Esgatou participações marcantes no quarto Exterminador do Futuro e no sexto Harry Potter, roubando o show na pele da bruxa má Belatriz Lestrange. Garantiu lugar também nas duas partes derradeiras da série e na nova obra do marido Tim Burton, a ser lançada em 2010, Alice no País das Maravilhas.
6ª posição: Jodie Foster em Valente (2007)
Há quem diga que a experiência pouco conta nesse mundo passageiro em que estamos vivendo. Especialmente no cinema, hoje um tipo de diversão muito mais prezado pelos jovens do que pelo público mais experiente. É fato que são os adolescentes que lotam multiplexes para ver os blockbusters do momento, e não intelectuais que pretendem sentar-se confortavelmente e assistir a uma obra de arte. Talvez por tudo isso, a voga do momento é dizer que atuação é uma vocação, um dom, e não apenas um ofício. Ou você nasce sabendo, ou você nunca será capaz de aprender. Jodie Foster é a prova cabal de que as coisas não são tão simples assim, e nunca de fato chegam a ser em qualquer discussão equilibrada sobre uma forma de expressão tão complexa quanto o cinema. Atuando desde os sete anos, com o Oscar em cima da lareira desde vinte e seis, Jodie passou pela carreira de forma seletiva, quase sempre notável dentro de sua área. Passou muito perto de ser considerada a funcionária do mês, e de brinde ainda levou o reconhecimento de uma das atrizes mais talentosas de todos os tempos. Na pele da apresentadora de rádio Erica Bain no pouco visto Valente, Jodie constrói aos poucos uma performance que alcança a integração completa com os outros elementos do filme. Perturbada, aflitiva, sombria e simples a um tempo, a personagem se torna parte indissociável da trama nas mãos de Jodie. Os caminhos que ela segue parecem naturais em sua interpretação completa, que se despe de sutilezas para dizer claramente o quão provocante e contestador pode ser o raciocínio humano. A Erica de Jodie é de verdade, é palpável, é real. E tem boa parte do mérito pela qualidade do filme do qual faz parte.
Futuro? Deve finalmente retornar a direção após o fracasso na pré-produção de Flora Plum, dessa vez comandando as câmeras e fazendo serviço de coadjuvância a Mel Gibson, no papel de um homem que anda pelas ruas com um fantoche na mão e o trata como uma pessoa de verdade. O título provisório é The Beaver
5ª posição: Marcia Gay Harden em O Nevoeiro (2007)
Seres humanos podem ser tão assustadores quanto monstros que nem mesmo sabemos de onde vieram. Essa cruel e desoladora mensagem talvez seja o centro sobre o qual se constroí a trama de O Nevoeiro, a mais recente adaptação da obra do mestre do terror Stephen King empreendida pelo sempre competente Frank Darabont. A teoria soa mal a ouvidos tão acostumados a glórias e conquistas como os nossos, mas é impossível não sentir nojo de si mesmo depois de assistir a forma como gente como a Sra. Carmody aje quando sua vida está em jogo. Disfarçada de si mesmo como uma religiosa fervorosa, a mulher é uma profeta de olhos falsos, fala inflamada e obsessão a beira do ridículo pelo sobrenatural como o sagrado. É equivocada, é enervante e é ainda mais repulsiva do que qualquer dos monstros que invadiram a cidade em que se passa a trama, em que o mercado local é o último refúgio de pelo menos uma dezena de cidadãos. E se a personagem é mesmo tudo isso, a culpa é toda de Marcia Gay Harden. Fascinante, contida e visceral a um tempo, detalhista e brilhante num mesmo quadro, vilã e heroína de diversos pontos de vista, a atriz faz um trabalho complicado de forma magistral, mostrando todo um talento que permanece escondido em produções médias que poucas vezes são capazes de se destacar. Seu brilhantismo não depende de cenário ou produção, e é quase sobrenatural observar como basta a câmera documental do diretor estar ligada para Harden tomar o centro do palco. Sua cena-maior, a oração a luz de velas em um banheiro sujo do mercado, é mais do que hipnotizante. É revoltante. Ou talvez não hajam adjetivos que façam jus a uma performance tão marcante.
Futuro? Tem uma personagem recorrente na série de TV Damages, estrelada pela amiga Glenn Close (101 Dálmatas), mas não para de trabalhar em cinema por isso e já está pronta para lançar The Maiden Heist, filme de assalto estrelado pelos veteranos Morgan Freeman e Christopher Walken como dois seguranças de museu que decidem se aposentar roubando o cofre do lugar. Também é uma das que estão sob o comando de Drew Barrymoore, diretora estreante na comédia romântic Whip It!.
4ª posição: Jennifer Hudson em Dreamgirls (2006)
Há certos momentos produzidos pelo cinema e suas sutilezas que são verdadeiramente impossíveis de se descrever. Não só pela qualidade, mas ainda mais freqüentemente pela surpresa que provocam, pelas emoções que despertam sem que ninguém esperasse. Talvez um dos mais recentes momentos do tipo tenha sido quando Jennifer Hudson soltou o vozerião para declarar resolutamente que não deixaria seu amado deixá-la para trás em “And I Am Telling You I’m Not Going”, o maior e mais marcante momento do subestimado musical Dreamgirls, projetado para dar um empurrão definitivo na carreira cinematográfica da cantora Beyoncé e revertido em um show particular de Hudson, ex-perdedora de um American Idol e hoje atriz renomada, com um Oscar na prateleira. O mundo gira, não? E ninguém, ninguém mesmo, estava esperando aquela explosão de emoção visceral liberada sobre um palco pequeno, iluminado por um holofote solitário, filmado de forma quase documental pelo diretor Bill Condon. É quase irônico que tenha sido justamente por essa surpresa que a performance de Hudson tenha crescido tanto em um filme que, além de sua presença, pouco tinha a oferecer para os fãs de cinema e não de música. Dreamgirls, dali para frente, é um show todo dela, construído aos poucos durante pelo menos uma hora de projeção até chegar aquele momento de pura magia, quando ficou mais do que claro a quem a estatueta de ouro pertencia. Hudson foi além da barreira do que os críticos adoram chamar de pieguice e criou um desempenho simbólico, hipnotizante e puramente emocional. Depois de presenciar tamanho talento, não há como discutir o quarto lugar de uma estreante brilhante.
Futuro? Participou da primeira investida cinematográfica da série Sex and The City e foi uma das figuras centrais de A Vida Secreta das Abelhas, mas de inédito mesmo só o suspense O Efeito da Fúria, que deve chegar em breve diretamente para as prateleiras brasileiras.
3ª posição: Audrey Tatou em O Fabuloso Destino de Amélie Poulin (2001)
Quem conhece esse rosto não pode deixar de sorrir ao vê-lo por aqui, e se eu, você e todo mundo que testemunhou a busca dessa estranha garota francesa por um acerto em sua bagunçada vida em meio a toques surrealistas e delirantes não consegue simplesmente esquecer essa expressão de esperteza é porque a história de Amélie é acima de tudo universal. Pode ser que não tenhamos um pai caduco que cria anões de jardim como se fosse preciosidades, nem vizinhos com ossos frágeis que pntam sempre o mesmo quadro, muito menos uma caixa de lembranças guardada no assoalho de nossa casa, mas é inegável que de alguma forma esse tipo de excentricidade se liga a tudo que vemos sem de verdade notar. Nosso mundo não é normal, é estranho e é pulsante em seu frenesi, com bem nos mostra Amélie em uma das primeiras cenas do filme. O restante é uma lição de como viver bem e intensamente, tudo guiado pela câmera de Jean-Pierre Jeunet e pela atuação ao mesmo tempo fiel a estranheza e a normalidade de Audrey Tatou, uma das mais talentosas e subestimadas atrizes que surgiram nesse novo século. A atriz, aqui, é a alma de todo o filme e de toda a trama, encarnando uma Amélie que caminha com facilidade na tênue linha entre a simpatia e a repulsão. É difícil descrever o sentimento exato de ver uma personagem tão complexamente simples em tela, mas talvez seja melhor dizer que Tatou traz um tempero singelo a Amélie que a torna simpática até aos olhos do espectador indisposto. Amélie, hoje quase sinônimo de Audrey, é uma garota doce e linda, que passeia pela vida e deixa a marca que todos nós secretamente desejamos deixar. Sorte a dela, e a nossa, que conseguimos uma paladina de nossas vontades escondidas.
Futuro? Interpreta a personagem-título de Coco Antes de Chanel, filme bastante esperado pelos que conhecem a fantástica história de vida da criadora da maior grife de roupas e perfumes do mundo. O filme fez tanto barulho fechando o Festival de Cannes que até garantiu uma improvável distribuição nos cinemas brasileiros, ainda sem data marcada.
2ª posição: Nicole Kidman em Moulin Rouge! – Amor em Vermelho (2002)
Há uma enorme diferença entre um personagem e um ícone, e talvez muita gente ainda não conheça essa tênue linha que separa seres que habitam obras de arte daqueles que sobrevivem para além delas. Um ícone é maior que sua obra, é mais simbólico e é mais imortal que qualquer trama ou circunstância, é algo que fica para sempre naquela arraigada memória afetiva e fotográfica. Quando a câmera do genial diretor australiano Baz Luhrmann mostra pela primeira vez o rosto conquistador da cortesã francesa Satine, é impossível não perceber de alguma forma misteriosa que, naquele momento, um ícone nasceu e veio para ficar. Branca como a neve, irresistível em seu já lendário vestido vermelho e de cabelos cor-de-fogo que rimam com tudo o que há de mais lindo no visual arrebatador de Moulin Rouge!, uma das mais polêmicas obras-primas do nosso século, Satine é puro deleite para os olhos e para os ouvidos com sua voz afinadíssima e etérea, mas vai além disso na interpretação transparente de emoções fortes imposta pela genialidade pouco valorizada de Nicole Kidman. A atriz, ainda em sua época de glória comercial, encontra o auge do talento na pele de uma mulher forte, insuspeitadamente íntegra, que é levada pelo amor a um final trágico que merece figurar ao lado de grandes obras imortais como Romeu & Julieta. De certa forma, não há nada mais forte do que amor proibido para a emoção humana, e Nicole explora isso de forma genial, deixando-se ver para além da beleza para revelar uma incorporação das mais impressionantes. Satine virou sinônimo de amor, seu visual se tornou um surpreendente padrão e a atuação de Nicole passou como uma das maiores injustiças da história do Oscar, que apenas a concedeu a estatueta por As Horas, um ano depois. É Satine, porém, que até hoje vive nas mente e nos corações de homens e mulheres ao redor do mundo.
Futuro? Uma série de fracassos após o Oscar de melhor atriz pode até ter apagado o nome de Nicole por um tempo, mas ela promete voltar mais uma vez ao topo com uma dupla de musicais que farão bastante barulho nos próximos anos. Nine é a adaptação de uma peça da Broadway pelo diretor de Chicago, que por sua vez já havia se inspirado no clássico Fellini Oito e Meio para desenvolver a trama. Já Rabbit Hole é um drama mais pesado sobre uma família que perde a filha e se vê jogada em um mundo de sonhos e cores parecido com o de Alice. Para finalizar, ela promete incendiar a tela num romance com ninguém menos que Charlize Theron em The Danish Girl.
2ª posição: Meryl Streep em O Diabo Veste Prada (2006)
O ano era 1978, o filme era O Franco-Atirador, uma das maiores obras do cinema americano sobre a Guerra do Vietnã, e pouca gente seria capaz de colocar suas fichas na então jovem atriz revelação Meryl Streep, que concorria pela primeira vez ao prêmio da Academia como coadjuvante na obra do diretor Michael Cimino. Menos gente ainda poderia apostas que aquela atriz de meros vinte e sete anos viria a se tornar uma recordistas da maior festa do cinema americano, e ainda seria freqüentemente chamada de melhor atriz da história do cinema. Que dirá que mereceria tudo isso e muito mais. Corta para 2006, com a adaptação do best-seller moderno O Diabo Veste Prada prestes a chegar aos cinemas do mundo inteiro, que esperava ansioso para ver as desventuras da garota de classe média Andrea Sachs nas mãos da tirana editora-chefe da maior revista de moda do mundo, a fictícia Runway. Aquela altura, todo mundo já sabia que a chefe em questão, de nome Miranda Priestly, era diretamente inspirada em Anna Wintour, poderosa chefona da Vogue, essa sim a maior publicação de moda do nosso mundo de verdade, para quem a autora, Lauren Weisberger, trabalhou no espaço de um infernal ano. O diretor e a roteirista não fizeram mais do que traduzir o veneno das palavras da autora em um mundo de verdade, de imagens e situações comandadas por atrizes afiadas. Mas quando Meryl entrou em cena mostruosa com seu cabelo branco e olhar de desprezo na pele de Miranda, não houve olhos na platéia que não se voltasse para ela. Mais do que um roubo de cenas, O Diabo Veste Prada se tornou o show particular de uma atriz mais do que excepcional, e Meryl construiu cuidadosa e sensacionalmente uma Miranda revoltante para, perto do final do filme, desmoronar toda essa imagem e revelar a editora como, veja só, um ser humano de carne e osso. Se ela chorou e nos fez emocionados ao seu lado, mesmo na pele de uma vilã, o que mais dizer? Mestre é mestre, afinal.
Futuro? Foi comandada por Nora Ephron (A Feiticeira) no novíssimo Julie & Julia, história de romance e culinária que deve sair do forno em Agosto, e por Wes Anderson (A Vida Marinha) na animação-freak The Fantastic Mr. Fox, tirada direto de um conhecido livro infantil do autor de A Fantástica Fábrica de Chocolate. Por fim, deve ser filmada pela câmera esperta de Nancy Meyers (Alguém Tem que Ceder) em sua nova comédia, ainda sem título divulgado.
Bom, pessoal, e essa foi nossa primeira lista da década! Sabe, um dia eu pensei que, no final das contas, estamos mesmo prestes a adentrar na segunda década do novo século (nem tão novo assim, afinal)! E não custa nada dar crédito a quem merece. Mais uma coisa, essa lista foi feita mesmo para ser polêmica, então quero comentários dizendo o que acharam do ranking, quem faltou, quem não deveria estar aí, quem está em posição errada, quero ver vocês falando de cinema um pouco também, certo?
Os melhores filmes para todos vocês e até mais!