Uma Vida Iluminada (Everything is Illuminated, EUA, 2005)
De: Liev Schreiber
Com: Elijah Wood, Eugene Hutz, Boris Leskin
106 minutos
Tudo a nossa volta é iluminado, pulsa com uma luz eterna e ofuscante, capaz de trazer as memórias mais remotas de volta e buscar tudo o que já houve e haverá no distante tempo antes que possamos perceber, como algo que está ao alcance das nossas mãos. É de fato uma pena que nem sempre percebamos isso, com tudo o que nós mesmos construímos nos distraindo do que pode ser mais importante do que uma vida toda... em um único momento. Presos em nossa Matrix do mundo real, somos iludidos para seguir a vida como se não houvesse nada de especial nela, enquanto o mundo nos mostra o quanto coisas milagrosas podem acontecer a qualquer momento. Basta nos esforçarmos para enxergá-las e aproveitar cada segundo. Afinal, qualquer momento pode e deve ser único, incomparável nessa encantadora experiência que é a vida. É tudo isso que “Uma Vida Iluminada” vem para provar com sua narrativa lúdica e envolvente, seus personagens fascinantes e sua história que resgata o mais primitivo censo de apreciação não só do cinema, mas de qualquer forma de arte. “Uma Vida Iluminada” é um filme que quer ser lembrado, sobre pessoas que fizeram de tudo para realizar o mesmo em uma época que talvez fosse melhor ser esquecida. Mas mesmo no campo mais infértil é capaz de florescer a mais linda das flores, uma luz do passado capaz de iluminar o presente e, quem sabe, ser redescoberta no futuro. Aqui, estamos falando da Segunda Guerra Mundial, um dos momentos mais negros da história da humanidade, do bárbaro e repulsivo Holocausto infringido pelos nazistas aos judeus, tempo em que o ar cheirava a sangue e a humilhação era o cotidiano de milhões de pessoas espalhadas por toda a Europa oriental. Jonathan Safran Foer (Elijah Wood) não presenciou tudo isso, mas é um jovem que construiu todos os alicerces de sua vida apoiado no passado e na luz dos pequenos detalhes. Quando sua avó vem a falecer, ele fica de posse de uma foto antiga, retratando seu avô e outra mulher, anotada no verso como Augustine, ao lado do nome de uma aldeia ucraniana na época da invasão alemã. Procurando mais sobre seu iluminado passado, Jonathan decide buscar por essa mulher e por esse lugar, e para isso conta com a ajuda de Alex (Eugene Hutz), um guia ucraniano obcecado por tudo que tem relação com a América e seu avô (Boris Leskin), um homem amargurado que não demora a desenterrar o próprio passado na longa viagem. Sim, Uma Vida Iluminada é sem sombra de dúvida um road-movie, mas não é um road-movie normal. É único. Exatamente como seu protagonista e como todo o mundo que o cerca.
Ator em tempo integral, é encantador presenciar a imensa habilidade com que Liev Schreiber (”Sob o Domínio do Mal”) constrói situações detalhistas e intimistas que revelam de forma gradual a essência mais pura de seus personagens, a cada minuto mais fascinantes e envolventes para o espectador. Uma manipulação (no bom sentido da palavra) humanista e habilidosa que contribui muito para que o final de “Uma Vida Iluminada” seja tão emocionante. O segredo, é claro, foi sair da normalidade, provavelmente com uma ajuda substancial do autor, que não por coincidência divide o nome com seu protagonista. Na ficção, Foer é um colecionador de nada em especial. O que ele guarda e preserva são memórias, objetos que representam momentos, felizes ou tristes, mas sempre memoráveis. Ele é um homem com medo de esquecer e de ser esquecido, uma espécie de radicalização do que todos nós desejamos ao caminhar por esse mundo. Saber de onde veio para saber para onde vai. Pode parecer clichê, mas funciona perfeitamente para cada uma das jornadas retratadas por Schreiber em “Uma Vida Iluminada”. Seus diálogos não precisam de grandes delongas para encantar e sua forma de levar a trama é cadenciada com perfeição, sendo levada pelos acontecimentos sem nunca perder a serenidade que se espera de um road-movie. E, é claro, sem se esquecer do impacto visual que o conceito do filme exige. Embora surja em momentos inesperados, a beleza retratada em “Uma Vida Iluminada” brilha com intensidade radiante, presenteando o espectador com pequenas pílulas de beleza plástica em meio a uma trama que por si só já garante o interesse. É como um ingrediente a mais, um detalhe que acaba se revelando essencial para transmitir a mensagem que pretende e uma promessa executada com perfeição. Embora pareça estranho, a Ucrânia tem paisagens impressionantes pelas cores fortes e clima bucólico, quase como uma viagem no tempo a alguns passos de distância que transparece nos melhores momentos de “Uma Vida Iluminada” como parte integrante de sua receita, e não um elemento aparte, apenas para ser apreciado e esquecido. Se fosse assim, o filme se perderia do próprio conceito. Afinal, se um filme como esse possui uma única grande ambição, é ser inesquecível. Embora seja um conto profundamente pessoal pa ra o diretor (Schreiber é filho de judeus mortos no Holocausto), “Uma Vida Iluminada” possui aquele ingrediente atemporal impossível de descrever que acaba tocando a mente e a emoção de cada pessoa de uma forma diferente. Assim como uma pintura que vai além da beleza plástica, a obra de Schreiber é um filme que vai além dos domínios do cinema para gravar-se na memória mais arraigada de cada um que presenciou o milagre da criação de uma obra de arte. Afinal, todos nós possuímos um passado que queremos nos lembrar. A memória é o ser humano em sua representação mais fiel, e é isso que “Uma Vida Iluminada” traz a tona com habilidade emocionante. E com ajuda de gente talentosíssima, é claro.
A começar por Elijah Wood (“O Senhor dos Anéis”), abraçando a excentricidade de seu personagem com coragem digna de um grande ator e ao mesmo tempo tornando-o o mais humano que pode por baixo de todos os trejeitos e caracterizações impostas pelo roteiro. É uma interpretação audaciosa e ousada, uma prova incontestável de talento que só encontra triunfo em seu caminho, que sob uma primeira vista não deveria impressionar, mas envolve aos poucos e chega ao final como a representação perfeita de tudo que um filme como esse deveria oferecer. Não muito atrás, o estreante Eugene Hutz rouba algumas cenas com seu retrato carregado de honestidade de um guia tão incomum quanto seu passageiro. Partindo da posição de coadjuvante, ele transforma a jornada física e emocional de seu personagem em um produto tão fascinante quanto a do protagonista, o que acrescenta ainda mais encantamento a já triunfante receita de “Uma Vida Iluminada”. Para completar o trio principal, o russo Boris Leskin (“Homens de Preto”) se junta a viagem para dar a ela a ligação emocional mais forte de todo o filme, os momentos mais tranformadores e o grande vetor de toda a comoção do desfecho da trama. É claro, há também a surpreendente habilidade de Liev Schreiber com a câmera, acertando nos ângulos e nunca desisitindo da missão de surpreender o espectador a cada take com um maneirismo diferente e encantador. Intimista quando é preciso e grandiosa quando a trama exige, a câmera do ator não apenas registra o que se sucede, mas concede alma a cada ato e uma climatização distinta a cada momento. Radiante durante todos os 106 minutos, a luz que brilha em “Uma Vida Iluminada” ainda é embalada com o ritmo contagiante da música européia compilada por Paul Cantelton (“O Escafandro e a Borboleta”), que dita o ritmo de cada movimento de câmera e de cada diálogo iluminado de um filme capaz de trazer o sorriso e a emoção a um tempo ao rosto do espectador. Raro, brilhante e absolutamente inesquecível.
Nota: 9,5
11 comentários:
Excelente comentário sobre o filme Uma vida iluminada.
Parabéns!
Cara, legal, o seu blog, gosto de blogs com critica de cinema da pra ficar sabendo de muita coisa boa que esta lançando nas telonas.
So uma dica, como vc escreve bem detalhadamente, tira esse preto do fundo.... atrapalha a leitura.
Vi que falou do Steven King, não gosto do genero em si, mas ele é uam exceção.Ele é o cara!
:) abraços veio.
um o filme surpreende...mas 9,5 acho um pouco demais...mas é legal, mereçe uns 8..
Obrigado pela retribuição! rs
Na proxima edição do Sunshine to pensando em chamar uma galera pra ser colunista, escrever um artigo gostaria de escrever algo sobre cinema?
:) flw
Ainda não vi e provalmente não assistirei..
meu nome tá sujo dos filmes da lan house que não paguei !
:)
QUWHquhwuQqwQ
BOM.. mas deve ser um filme bom..
não por o ator ter participado do Senhor dos Anéis, mas sempre achei ele um bom ator.
:)
abração !
Então o esquema é fácil.
O artigo terá que ser algo fora de linha de tempo, não pode ser algo datado ou fazendo referencias a um dia especifico, exemplo, vc escreve hoje falando dos filmes de março, não vai dar certo, pq?
PQ a revista sera lançada a cada nova estação, exatamente no solisticio de cada uma, entao teoricamente os artigos estaram sempre "velhos" nem da pra escrever algo para o futuro...rs não temos como advinhar.
Os artigos entao terao que ser materias sem referencia a datas.
Claro, artigos como "os 10 melhores filmes dos anos 80" por exemplo estao dentro, pq anos 80 passo faz mais de 15 anos...rs
Então não sei se compliquei tudo com essa explicação confusa...rs
Nossa, quanta informação!!! aadorei
=D
A ideia é boa cara! manda ver.
Ahn, eu demorei pra responder pq fui resolver umas pendencias.
Sabe, até hoje eu não assisti ao filme, por mais que eu tenha um interesse em ver. Vou tentar dar uma conferida.
Tem um selo lá no meu blogue pra ti, cara!
Os posters me lembraram muito a série Pushing Daisies *_*.
Falando nisso Caio, algo a dizer sobre o filme da série Pushing Daisies?
A estética do filme, a fotografia, me lembram muito Pushing Daisies, é uma série - muito boa, por sinal.
=) ateh logo!
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