

Austrália (Australia, Austrália/EUA, 2008)
De: Baz Luhrmann.
Com: Nicole Kidman, Hugh Jackman, David Wenham, Brandon Walters.
165 minutos
Realizar uma obra-prima, por incrível que pareça, pode não ser um bom investimento a longo prazo para o cineasta responsável por sua orquestração. Já que nossa percepção de cinema é toda baseada em expecatativas e como elas se comparam ao resultado real, uma obra-prima enterrada anos no passado pode voltar para assombrar um diretor que, afinal, pode não estar querendo repetir o feito. Mas nossos olhos não vêem intenções, e a interpretação das imagens que vemos na tela pode não ser tudo o que esperávamos. Ousado, ambicioso e genial, o australiano Baz Luhrmann foi elevado a uma categoria acima da enorme maioria dos outros diretores em 2001, quando sua estilizada e emocionante história de amor em forma de musical encantou ao mundo inteiro e levantou polêmica entre críticos e admiradores. “Moulin Rouge”, o filme em questão, poderia ser exagerado, pretensioso e cheio de excessos e heresias na visão de alguns, mas difícil mesmo era negar a genialidade visual de Luhrmann e segurar as lágrimas diante do final trágico de uma obra que essencialmente envolvia por não querer falar sobre nada além do amor. Pode parecer ingênuo, mas fez todo o sentido diante da câmera de Luhrmann e da interpretação icônica de Nicole Kidman. Praticamente deixado de lado no Oscar 2002, a revelia da opinião da maioria dos críticos de cinema, Baz Luhrmann seguiu o trabalho magistral de “Moulin Rouge” com seu habitual intervalo ao estilo Kubrick. Durante sete anos ele amadureceu uma idéia que poderia amplificar a um nível estratosférico a ambição que marcou a sua carreira e ainda lhe dar a oportunidade de homenagear sua terra natal no que ele chamou de “...E o Vento Levou da Austrália”. O resultado da idéia chegou aos cinemas com uma expectativa tão grande e uma mobilização tão intensa que foi impossível evitar aquele tipo de espectador que entrava no cinema esperando ver os mesmos tons fortes e cortes rápidos da última obra do diretor. E se há algum filme de que “Austrália” passa realmente longe, esse filme é “Moulin Rouge”. O que não significa que um dos dois filmes precise ser ruim. Não há aqui a dramatização exagerada e o romantismo inocente que encantava no filme de anos atrás, muito menos a montagem teatral dos cenários ou as luzes que coalhavam a Paris do musical. Cada um ao seu nível e no que pretendem, ambos são filmes vitoriosos que envolvem o espectador em uma jornada encantadora. Ainda assim, poucos arriscariam, sem saber, que se tratam de dois filmes dirigidos pela mesma pessoa. E é quando um diretor se confunde com sua obra que a genialidade se torna incontestável.
Baz Luhrmann é um mago da imagem, um homem capaz de transformar cada tomada, por mais banal que seja, em uma obra de arte. E se há uma lição clara que ele tenta passar com a imagem em “Austrália” é que ousadia nem sempre é a resposta. Luhrmann não tenta inovar nos movimentos pela paisagem de seu país e nem nos ângulos de câmera que usa para contar a história a que se propõe. Mas de alguma forma indecifrável, a imagem que ele cria com seus cortes e movimentos de certa forma convencionais é milhares de vezes mais deslumbrante do que qualquer coisa produzida por Hollywood nos últimos tempos. Suas panorâmicas pelas paisagens são quadros pintados com agilidade de um artista que sabe o que faz, e a climatização que sua câmera impõe nos momentos de adrenalina não poderia ser mais perfeita e emocionante para o espectador. Mesmo quando se concentra no âmago de seus personagens, Luhrmann revela uma grandiosidade surpreendente, filmando interpretações como se cada detalhe se integrasse ao cenário e fazendo de cada movimento um novo elemento de encantamento. Em resumo, se há alguém para ser aplaudido de pé em “Austrália”, esse alguém é sem dúvida nenhuma Baz Luhrmann. Idealizador de sua própria história, o diretor contou com uma dupla de roteiristas ao seu lado para criar os acontecimentos que movimentam o filme. Com Stuart Beattie (“30 Dias de Noite”) e Ronald Harwood (“O Escafandro e a Borboleta”) prestando assistência, Luhrmann construiu uma história vibrante e movimentada a cada segundo que nunca deixa cair a atenção do espectador, mas também se mostra um tanto quanto esquizofrênica em sua concepção. Ao retratar a vida de uma lady inglesa ao país que dá nome a obra a beira da Segunda Grande Guerra, Luhrmann passeia por drama, comédia e aventura sem nunca deixar perder de vista as proporções épicas que transparecem a cada take de “Austrália”. De uma difícil e fatal travessia a uma dolorosa separação e o final triunfante movimentado pela chegada da Segunda Guerra ao continente, passando por relações complexas entre os personagens que tratam de preencher o âmbito emocional da trama, o roteiro é conduzido com habilidade, mas nunca deixa esquecer o quanto pretende. Isso pode ser uma virtude ou um malefício para uma obra cinematográfica. Mas acima de tudo demonstra um dos poucos lampejos de ousadia de um filme tecnicamente perfeito.
A trama encontra seu ponto inicial logo após a entrada dos EUA na Segunda Guerra, com os japoneses avançando pelo Pacífico em todas as direções e se aproximando perigosamente das ilhas da Oceania. Nesse panorama mundial, não há nada que deixe transparecer a tensão por que passa a Austrália habitada por nativos, fazendeiros poderosos e inescrupulosos, damas mimadas e vaqueiros grosseiros. É com esse cenário da grande cidade de Darwin que a lady inglesa Sarah Ashley (Nicole Kidman) ao desembarcar na ilha visando convencer o marido fazendeiro a vender seu pedaço de terra no Sul. O que ela descobre rapidamente é que Faraway Downs, a fazenda em questão, é a única da região que não é dominada por um poderoso fazendeiro, e que seu marido foi morto por um dos homens desse magnata inescrupuloso. A trama se estende por anos a fio mesclando todos os gêneros imagináveis e ainda discutindo origens, preconceito, honra e vingança sob uma ótica bem clara e agressiva, tomando por linha-mestra o amor de Sarah pelo vaqueiro Drover (Hugh Jackman) e seu relacionamento fraternal com o garoto nativo Nullah (Brandon Walters), narrador de toda a história e ponto de referência para o clímax excepcionalmente bem montado. Mas se a trama evolui através das épocas, é responsabilidade dos atores retratarem o amadurecimento de seus personagens. Não por acaso, o seleto elenco de “Austrália” cumpre muito bem a função. Nicole Kidman, repetindo a parceria com Luhrmann, ainda é uma das atrizes mais transparentes e eficientes na hora de transmitir emoções e compor personagens. Com seu retrato sutil da lady inglesa que protagoniza o filme, Nicole mostra que sabe mesclar carisma, detalhismo, tiradas cômicas quase despropositais e uma caracterização não menos do que perfeita. Mas se a desenvoltura de Nicole já era esperada, o talento desavisado de Hugh Jackman (“X-Men”) surpreende. Além de demonstrar o mesmo carisma de astro que o sustentou pela carreira, o ator adiciona um tempero emocional e racional a seu personagem que o torna quase magnético na tela. Drover é simplista, não raro o tipo de personagem que irritaria pela falta de princípios, mas nas mãos de Jackman cresce em personalidade e identificação. Pouco o que fazer tem David Wenham (“Van Helsing”) além de encarnar o típico vilão nada sutil que de uma hora para outra se torna um oponente a ser batido nos debates verbais. Wenham tem o porte e a prepotência que o papel exige, mas não vai além disso e é facilmente ofuscado por seus companheiros de cena. Não que isso realmente influa no resultado final, é claro. “Austrália” é, de uma forma ou de outra, uma viagem de misticismo, paixão, paisagens deslumbrantes e seres humanos inesquecíveis. Ponto para Luhrmann, sorte a nossa. Assista sem medo.
Nota: 8,5
5 comentários:
Sinceramente não vi o filme. Porém, apesar de sua boa resenha, não sei se quero ver.
O elenco de protagonistas é de enganadores. HJ é só o Wolverine e mais nada. E Nk não consegue ser boa nem sendo dirigida por Kubrik ou Lars Von Trier.
Parece ser bom! Vou conferir!!
Ainda não vi Australia. Ouvi muito mal dele. Sem contar que é enorme... quem sabe um dia! - mas o trailer foi bom.
Olha... não gostei muito do filme... mas pelo Hugh... vale a pena... rs!
Bem legal seu blog!
=)
Gostei de austrália, poderia ser menor a duração, mas o filme é bacaninha.
Tb escrevo sobre filmes no meu blog, dá uma conferida lá. Tem desde comédias românticas aos clássicos Laranja mecânica foi bem debatido
Abraço
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