domingo, 12 de abril de 2009

Crepúsculo – Como um fenômeno da literatura encontrou seu lar… no cinema

Crepúsculo (Twilight, EUA, 2008)

De: Catherine Hardwicke

Com: Kristen Stewart, Robert Pattinson, Billy Burke, Ashley Greene

122 minutos

Vampiros sempre foram criaturas românticas. Desde o princípio literário das criaturas sugadoras de sangue noturnas, o amor não realizado e os desejos reprimidos se tornaram um tema inevitável para qualquer obra com base no mito. O Drácula de Bram Stoker era maligno, quase repulsivo de tão inescrupuloso, um vilão dos mais ameaçadores, mas era também um homem que descarregava o peso de ter visto seus amores apodrecerem pelo tempo enquanto ele continuava intacto. Com o passar dos séculos, ele aprendeu que seria melhor não se apaixonar. Chega a ser um caso para criar piedade e fazer pensar o que faríamos naquela situação. Com a atração do sobrenatural mesclada com temas que fazem parte de nossa vida real, é quase irrevogável a atração que os vampiros provocam sobre nós, meros mortais. Não por acaso, o mito chegou bem vivo ao nosso século e, quem diria, ultrapassou a esfera dos apreciadores mais eruditos de literatura para se tornar produto para lá de vendável. Que o diga a romântica Stephenie Meyer, que acertou em cheio o imaginário do público adolescente já em seu romance de estréia, o fenômeno de vendas “Crepúsculo”, hoje título fundador de uma duradoura série. Histeria adolescente e clichês a parte, Meyer é uma boa contadora de histórias que ganha muito com a paixão das próprias palavras e com os personagens fascinantes que brotaram de sua imaginação. Mas é inegável a sensação de desajuste que fica depois de passar os olhos pelas linhas de “Crepúsculo”. É quase como se aquilo que tanto te agradou naquelas páginas estivesse de alguma forma no lugar errado. Como sempre, o instinto nos diz muito mais sobre o que vemos ou lemos do que uma análise fria. A sentença final? “Crepúsculo” é uma história feita para encher as telas do cinema. É quando encontra imagens para materializar a paixão de Meyer e aquela que fervilha entre os personagens que a romântica história de amor entre um vampiro e uma humana ganha força e emoção de verdade para conquistar até mesmo aquele público que sentiu uma espécie de culpa por se deixar levar por uma composição literária tão simplista. Aqui, se unindo com magia das imagens em movimento, é que tudo faz mais sentido e leva a um nível de apreciação superior que excede o escopo da escrita de Meyer. Em suma, “Crepúsculo” é um testemunho incontestável de que o cinema é a forma de expressão mais plena e completa que o mundo já viu passar. O porquê vem nas linhas abaixo.

Para começar, é na criatividade ousada e cuidadosamente medida do roteiro de Melissa Rosenberg que “Crepúsculo”, o filme, encontra seu ponto para provar e sua virtude mais impressionante. Roteirista de poucas obras notáveis e mais conhecida como uma das criadoras da elogiada série Dexter, Rosenberg impressiona por decisões surpreendentes que calam de uma vez por todas os críticos que já preparavam sua ladainha de “roteiro medíocre” e “fidelidade excessiva”. Seu script quase transparece ponderação a cada palavra e cada cena, ao mesmo tempo que encontra em alguns momentos o triunfo na falta de sutileza. Transgredindo partes inteira das obras de Meyer e trocando cenários e acontecimentos a todo o tempo, a roteirista encanta por escolhas certeiras e momentos de puro brilhantismo em que mescla elementos de sua adaptação particular com frases inteiras do livro que se encaixam com perfeição. Em resumo, trata-se de um trabalho não menos que perfeito, que chega ao final com notas de triunfo e o fechamento de um arco sem se esquecer de deixar o espectador na expectativa pelas mais do que garantidas continuações. Se continuar nessa marcha, é melhor esperar obras cada vez melhores. Encanto natural não falta na trama toda dirigida pela protagonista Bella Swann (Kristen Stewart), espertamente adaptada de narradora em primeira pessoa para olhos do público em uma trama que caminha em ritmo hipnotizante e adaptável a cada minuto. Ela se vê obrigada a se mudar para uma cidadezinha chuvosa no leste americano, para morar com o pai, o chefe de polícia Charlie (Billy Burke), quando a mãe parte para uma longa e inevitável viagem com seu novo noivo. A partir do ponto em que esse momento prático está resolvido, o filme habilidosamente mistura em um mesmo pacote a adaptação da garota na escola local com sua crescente fascinação pelo recluso Edward Cullen (Robert Pattinson), irmão mais novo de uma numerosa família considerada excêntrica pelos colegas. Enquanto é cortejada por “garotos comuns” e se vê as voltas com um silêncio constrangedor em casa, Bella se envolve cada vez mais dom Edward e se vê em meio a uma caótica jornada de hipóteses e insinuações tratadas com delicadeza e habilidade ímpar pelo roteiro. Do momento da descoberta adiante, Rosenberg muda o tom sem perder o ritmo e nos presenteia desde diversão pura e simples até tensão milhares de vezes mais eficientes do que a construída por Meyer. E ainda encontra tempo em meio a tudo isso para recriar a atmosfera de paixão adolescente e ainda resolver confiltos familiares sem perder o pique por um segundo nem atravancar a narrativa. De fato, um trabalho exemplar que encontra apoio indispensável na direção.

Catherine Hardwicke, outro alvo preferencial pré-definido dos críticos que pretendiam massacrar “Crepúsculo”, faz um trabalho além das expectativas ao comandar as câmeras e criar as imagens que materializam a história que povoou a tarde e os sonhos de milhares de leitores. De forma mais objetiva, é bem verdade que a câmera trepidante e o estilo impactante de dirigir de Hardwicke não funciona o tempo inteiro, mas ainda assim é notável sua adaptação de diretora de drama intimistas sobre impulsão adolescente (“Aos Treze”) para uma competente comandante de espetáculos hollywoodianos. Sem perder a emoção honesta que transpareceu nas obras anteriores nem o senso crítico, a diretora chega a deixar dúvidas sobre a qualidade de seu trabalho no início da obra, mas aos poucos ganhar graça e elegância nos cortes e nas escolhas, movimentando-se de sua forma particular dentro da linguagem cinematográfica sem perder de vista o fato de que está comandando um romance vampiresco, alvo de puro escapismo e fascinação que não funcionaria dentro de uma direção que impusesse estilo sobre substância. É quase de se lamentar que ela não vá permanecer para as continuações. Surpresa também é a interpretação de Robert Pattinson que passou por “Harry Potter e O Cálice de Fogo” sem a chance de mostrar nada além de uma escada para o sucesso. Encarnando o Edward Cullen tirado em cópia carbono da obra original, Pattinson surpreende pelo talento e pela desenvoltura com que interpreta as emoções conflitantes que caracterizam o personagem, sejam aquelas naturais do mito dos vampiros ou particulares da trama que “Crepúsculo” narra. Trata-se de uma atuação surpreendente e detalhista que funciona durante uma parte impressionante da projeção e dá gás aos momentos mais naturalmente fracos do roteiro, criando uma espécie de balanço indispensável para o triunfo da obra. Por outro lado, Kristen Stewart (“O Quarto do Pânico”) não faz nada além de dar um pouco de alma a uma Bella menos encantadora do que na obra literária. Se o roteiro de Rosenberg acerta ao colocá-la representando o espectador, Stewart parece só entender essa intenção perto do final e durante boa parte do filme deixa a responsabilidade para os coadjuvantes carregarem a narrativa. Felizmente, eles não desapontam. Billy Burke (“Sem Vestígios”) é pura emoção em estado bruto e contido a um tempo, interpretação perfeita para o retraído e adorável Charlie. Ashley Greene (“O Rei da Califórnia”) e Peter Facinelli (“O Escorpião Rei”) fazem jus a seus personagens e, para embalar tudo isso, a trilha-sonora serena de Carter Burwell (“Na Mira do Chefe”) se torna em um elemento tocante e complementar as imagens. Composição acertada de um filme que encanta e deixa expectativas. E nem uma palavra sobre a rivalidade com “Harry Potter”. Afinal, estamos aqui para falar sobre cinema, não sobre histeria adolescente. E, como cinema, é inegável que “Crepúsculo” merece a atenção que anda recebendo. Com ou sem sangue derramado na tela.

Nota: 8,0

3 comentários:

Rubens Rodrigues disse...

Ainda não vi o filme, na vdd tô com o livro e vou começar a ler essa semana. Vou deixar pra ver o movie quando terminar o livro ^^'

Mais uma ótima crítica e gosto das referencias que vc faz antes de falar do filme^^

Até a próxima!!!

Renan Barreto disse...

Olha, Caio. Eu não vi o filme por puro preconceito. O Drácula do stoker é maravilhoso. Aliás um dos melhores filmes do gênero. Esse pra mim é muito teen, mas prometo deixar esse preconceito de lado e ver.

Valeu!!!

Brazileiro com Z disse...

cara, o que eu ja ouvi falar desse filme, mas ele não parece ser interessante
fa bem o tipo de high school musical, agrada mais o publico pre-adolescente e adolescente
flw cara
boa sorte ai