Um Sonho de Liberdade (The Shawshank Redemption, EUA, 1994)
De: Frank Darabont
Com: Tim Robbins, Morgan Freeman, James Whitmore
142 minutos
Vivemos todos em uma prisão. Por mais que tentemos negar, cada um dos limites que impomos a nós mesmo acirra mais essa vigilância e não demora muito em nossa vida para nos vermos sem ação a não ser tentar se sentir confortável naquele espaço limitado e naquele futuro medíocre que certamente não desejávamos de verdade. Resignação. Quando uma prisão de torna um lar? Se preferirmos permanecer em nosso mundo particular onde somos tudo o que podemos, e isso é o bastante, ao invés de partir em direção a um mundo que nos coloca como pequenas engrenagens somos desajustados? Lá fora tudo passa rápido demais, e aqui dentro é como se nada fosse tarde demais. Somos culpados ou inocentes? De alguma forma é possível fugir de toda essa prisão e viver como se deve no mundo liberto? “O medo pode lhe guardar prisioneiro. Esperança pode lhe libertar”. Pode soar como um slogan de efeito terrível, mas resume nas poucas e certas palavras tudo o que “Um Sonho de Liberdade” pretende e consegue passar ao espectador. Apesar de momentos dramáticos e quase aflitivos que se desenrolam através da projeção da obra de estréia Frank Darabont, trata-se de uma trama de otimismo ímpar e emoção a flor da pele que aflora a cada minuto com força extraordinária. É também um retrato fiel de uma prisão metafórica se desenrolando dentro de uma prisão concreta. Em Shawshank, ser prisioneiro não significa apenas estar entre os muros e guardas sem escrúpulos que cercam o lugar. Prisioneiro de verdade é aquele que se vê em estado de pura desolação, aquele que se vê sem a esperança de viver novamente lá fora. Para cada um daqueles prisioneiros, Shawshank era todo um novo mundo, um mundo em que significavam alguma coisa e tinham algo para buscar. O que fazer fora daqueles portões, agora que os anos se encarregaram de fazê-los esquecidos de uma sociedade que seguiu em frente? É desolador, mas é otimista. Porque se a esperança de um homem chegar para iluminar aquele ambiente, talvez a prisão deixe de ser lar relutante para ser o indesejável lugar que ficaria muito melhor vazio. Não se trata de dizer em alto e bom som que estar preso é a situação mais amarga que um homem pode encontrar em seu caminho. Não se trata de culpados ou inocentes. O ponto aqui é simplesmente viver com algum objetivo, ainda que tenha sido jogado naquele lugar como um delinqüente indigno do convívio da sociedade, seja lá porquê. “Um Sonho de Liberdade” é sobre o poder da esperança. Simples assim. Não um poder de nos levar a coisas grandiosas, mas simplesmente de nos encorajar a continuar em frente e, quem sabe, não hesitar se algo bom de verdade encontrar nosso caminho, mesmo que isso implique na quebra das grades que construímos para nós mesmos.
É deliciosamente surpreendente ficar sabendo que a história contada durante as mais de duas horas da obra veio da mente de Stephen King. Conhecido como o mestre do suspense e um dos autores mais largamente adaptados do nosso século, King mostra-se aqui um homem que vai além do assustador para encontrar na sensibilidade e na sutileza uma qualidade indispensável. É quando encontra uma premissa essencialmente dramática e joga nela pequenas pitadas de realidade saturada que o autor se mostra de uma vez por todas um mestre da escrita moderna, um homem que sabe combinar cada ingrediente de uma receita e trazer o resultado a nossos olhos como uma saborosa e inesquecível experiência. “Um Sonho de Liberdade” passa longe de ser uma fantasia, e de fato tem a dose de realidade perfeita, mas algo na narrativa do escritor adaptada pelo próprio Darabont nos envolve e aos poucos leva a um nível instintivo de entendimento que poucos filmes conseguem simular. É como um passeio em um mundo fantástico que diz muito mais sobre o nossa realidade íntima do que qualquer pretenso drama ultra-realista por aí. É fácil perceber que Darabont é essencialmente um roteirista quando seu texto consegue traduzir tudo isso para outra mídia e encher cada minuto com um detalhismo capaz de deixar qualquer fã do escritor com um sorriso no rosto. É um trabalho excepcional de roteiro e uma surpresa bem grande para quem conhecia Darabont como escritor de filmes de terror B como “A Mosca II”. Aqui, a trama acompanha Andy Dufresne (Tim Robbins), um contador que vai parar na terrível prisão de Shawshank condenado a três prisões perpétuas por ter assassinado a mulher e o amante. Habilidosamente, o roteiro não deixa claro se Dufresne é inocente ou culpado, e se o espectador acredita em sua alegação, é porque o instinto que logo dominará a tela dá seu primeiro suspiro. O fato é que, dentro da prisão, Dufresne faz amizade com Ellis “Red” Redding (Morgan Freeman), um carismático contrabandista de pequenos produtos para os presos que só passa sob a vista grossa do diretor Norton (Bob Gunton) porque conta com a ajuda do velho bibliotecário Brooks (James Whitmore). Não há uma linha narrativa rígida, mas sim uma cadeia lógica de acontecimentos que aos poucos vão se ligando para desembocar no final perfeitamente encenado e coalhado de emoções fortes. Não há uma cena descartável em “Um Sonho de Liberdade”, mesmo que a primeira vista alguns momentos soem gratuitos. Cada situação e cada acontecimento se encaixa no plano prático e no plano emocional da trama como a peça de um complexo e deslumbrante quebra-cabeça.
Se escrevendo Darabont só encontra triunfo a sua frente, sua estréia na direção também não deixa a desejar. Seus cortes são elegantes e, quando encontram grandiosidade, não caem no exagero. Movimentos desaparecem em meio a significância de cada tomada mas, mesmo sob uma análise mais fria, tudo se encaixa a perfeição entre roteiro e direção. Nada disso funcionaria, é claro, sem interpretações a altura para abrilhantar cada minuto dos longos, mas nunca cansativos, 142 de projeção. Tim Robbins (“Sobre Meninos e Lobos”) é o protagonista perfeito, carisma e competência a flor da pele para encarnar um personagem difícil e cheio de nuances e detalhes que, se medidos de forma errada, podem trazer toda a estrutura montada para a produção abaixo. Ainda bem, Dufresne encontrou um intérprete a altura para sua excentricidade tranqüila e seu desajuste visível em meio a todo o caos de Shawshank. Robbins é um respiro de calmaria em meio a tempestade e a representação perfeita do herói ambíguo que conquista pelos detalhes, e não pelo plano geral. Tão ou mais competente é Morgan Freeman (“O Cavaleiro das Trevas”) ao colocar toda a sinceridade de sua atuação para funcionar em função de um cativante narrador que chega a suplantar Dufresne em alguns momentos como protagonista da trama. Durante todo o decorrer da trama, Red é a linha-mestra que guia a narrativa e envolve de fato e espectador em torno da fascinação pela jornada daquele notável homem. Com tamanha responsabilidade, Freeman entregou uma atuação marcante e sincera que acaba por se tornar a ligação emocional e filosófica mais forte entre o espectador e o que se desenrola na tela. É o trabalho insinuante de um ator que se prova mais uma vez um talento indispensável da atual Hollywood. Os coadjuvantes também não deixam por menos e constroem todo um contexto fundamental para o desenrolar da trama. Em certo momento, a interpretação do veterano James Whitmore (“A Relíquia”) se torna tão pessoal que fica impossível não se emocionar, e a composição inflexível de Bob Gunton (“O Demolidor”) do diretor da prisão chega a ser odiosa de tão perfeita. Com tantas qualidades e precisão cirúrgica ao tratar de assuntos tão abstratos, não é a toa que “Um Sonho de Liberdade” figura em quase todas as listas de melhores filmes da história. Porque não é um filme que exige atenção extrema ou disposição do espectador que se arrisca. Assim como o slogan adianta, basta um pouco de esperança para acreditar.
Nota: 9,5
6 comentários:
Esse filme é fantastico, existem tantos outros com qualidade mas identico a esse não tem
http://eitavidameu.blogspot.com/
parece um otimo filme, ainda nao assiti
se der eu vou conferir
Qualquer filme com Morgan Freeman, tem q ser assistido!!
http://jokers.mimhospeda.com/
É um filme lindo, com muito conteúdo psicológico.
minha namorada que adora esse tipo de filme, uma otima dica para mim no dia que for na locadora vou alugar ele
Esse é com certeza um dos melhores filmes que eu ja vi. A cena da fuga e do reencontro dos amigos é emocionante.
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